Paprika
パプリカ
Realizado por Kon Satoshi
Japão, 2006 Cor – 90 min.
Com (as vozes de): Hayashibara Megumi, Furuya Toru, Yamadera Koichi, Hori Katsunosuke, Emori Toru, Otsuka Akio, Tanaka Hideyuki, Koorogi Satomi, Sakaguchi Daisuke, Iwata Mitsuo
anime animação thriller ficção científica
Poster
Uma máquina de psicoterapia experimental chamada DC Mini é roubada e utilizada para interferir nos sonhos dos cientistas que a desenvolveram. O DC Mini foi concebido para analisar e tratar problemas psíquicos, substituindo o relato oral do paciente pela intervenção directa do psicanalista. O criador do aparelho, Tokita (Furuya), virá a ser uma das vítimas e a Dra. Atsuko (Hayashibara) liga-se à sua mente para tentar deter o criminoso, num mundo onde as regras são inconstantes. A linha que separa o real do onírico torna-se cada vez mais difícil de identificar.

A nova investida de Kon Satoshi no território do thriller psicológico animado, mantém o dinamismo decorrente de uma montagem rápida e de uma banda sonora à altura, mas não alcança o impacto dramático de «Millennium Actress» (2001) — um triunfo difícil de replicar. A narrativa, adaptada de uma obra de Tsutsui Yasutaka, publicada no início da década de 1990, não se afasta muito de outros títulos de ficção científica onde as personagens viajam entre duas realidades, mas Kon tira proveito das potencialidades da animação tradicional, desprezando exibicionismos técnicos e investindo na fluidez dos movimentos e na caracterização de personagens e atmosferas.

Ainda que exista uma tendência para associar a animação a produtos concebidos para o mercado infantil, o meio é ideal para o cinema fantástico puro e maduro e, como Kon Satoshi o demonstra na maior parte da sua excelsa obra, para thrillers psicológicos. Em imagem real, o “efeito” imiscui-se e interfere, quando a sua execução não é eficiente (quando o digital a invade o orgânico de forma óbvia); a animação flúi sem interrupções e não há nada que não possa representar.

Paprika Paprika

Esta produção dos estúdios MadHouse e da Sony, não deixa de recorrer a ocasionais imagens digitais, mas a técnica predominante tem origem nos artistas e animadores, nos apurados cenários e na animação de uma infinidade de figuras e objectos que nos assaltam a vista, como num deslumbrante e tresloucado desfile que decorre dentro da mente de uma personagem manipulada pelo DC Mini.

Por mais de que uma ocasião, sentimos estar perante um cruzamento entre «Millennium Actress» e «Perfect Blue» (1998). O efeito é impelido pela personagem de Paprika, alter-ego virtual da Dra. Atsuko Chiba, com um design variante da Mima de «Perfect Blue» (e de Miyuki de «Tokyo Godfathers»). Paprika imita inclusive o saltitar flutuante do alter-ego da pop star, personagem central da primeira longa-metragem do realizador, algo que é mais do que um mero piscar de olhos. Na verdade, excluindo o mais familiar «Tokyo Godfathers», os três filmes de Kon Satoshi exploram personagens com fragilidades emocionais ou psicológicas, divididas entre a realidade e os sonhos ou psicoses.

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Em «Perfect Blue», num registo entre o thriller psicológico e o horror, a heroína vê-se perseguida pelo seu lado negro e questiona a sua sanidade. «Millennium Actress» lida com as memórias do passado de uma actriz, que se misturam e confundem com a ficção dos filmes em que participou. Em «Paprika», o realizador japonês opta por uma abordagem mais directa dos seus temas, algo que se reflecte na definição da personagem central. Ficam para trás as mulheres ligadas ao mundo do espectáculo, música, TV e cinema — cenários ideais para jogar com a dualidade real/ficção —, e somos agora apresentados a uma cientista que trabalha no campo da psiquiatria e dos sonhos.

Tratando-se de um filme carregado de informação (narrativa e visual), mais do que os anteriores, «Paprika» sugere uma revisão para breve. Mesmo que não tenhamos o privilégio de o poder rever em sala, a edição em DVD não será difícil de obter, uma vez que a distribuição está assegurada pela Sony/Columbia.

Fantasporto 2007 (Prémio da Crítica).

publicado online em 13/3/07

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